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segunda-feira, 16 de maio de 2016

Uma opinião sobre mudanças no Programa Mais Médicos.

Texto de Hêider Aurélio Pinto. Divulgado nas redes sociais. Fonte: https://www.facebook.com/heideraurelio.pinto/posts/1077223382373239



"Ministério quer menos estrangeiros no Mais Médicos"
Essa declaração atribuída aos novo Ministro merece alguma análises e críticas que seguem neste texto que acabei de escrever:
Retirar os estrangeiros do Mais Médicos é uma medida pouco democrática e nada inteligente
A imprensa tem noticiado que o atual Ministro da Saúde, do governo interino que consideramos ilegal e ilegítimo (i³), tem anunciado que reduzirá o número de médicos estrangeiros no Programa Mais Médicos (PMM) e dará prioridade e aumentará os estímulos para a atuação dos brasileiros. Reduzir arbitrariamente os estrangeiros é uma medida pouco democrática e nada inteligente, como demonstraremos a seguir. Dar mais estímulos aos brasileiros pode ser bom e apontaremos algumas sugestões neste texto.
1- A Lei do Programa já estabelece prioridade para o Brasileiros

A Lei 12.871 de 2013 obriga que cada vaga primeiro deva ser oferecida aos médicos com registro profissional no Brasil. Não ocupando todas as vagas, as remanescentes são então oferecidas aos médicos brasileiros formados no exterior e, só depois, restando ainda vagas é que as mesmas são oferecidas aos médicos estrangeiros. Ou seja, a prioridade já está dada em Lei desde a criação do Programa.
2- Só tem muito estrangeiro no PMM porque os brasileiros não quiseram ir onde a população mais precisava

Como em 2013 os médicos brasileiros só se interessaram em ocupar 22% das vagas oferecidas pelo PMM, aquelas necessárias para atender à população mais vulnerável e dos municípios com maior necessidade só foram ocupadas graças aos médicos brasileiros formados no exterior e estrangeiros.
3- É crescente a adesão dos médicos brasileiros no PMM, mas ainda insuficiente

Com o aumento dos estímulos aos médicos brasileiros, como pontuação adicional de 10% no concurso para a formação como especialista (residência médica) além da bolsa e dos auxílios moradia e alimentação, desde 2015 todas as novas vagas foram ocupadas por médicos brasileiros. A maior adesão dos médicos brasileiros foi e deve seguir sendo comemorada. Hoje, do total de 18,2 mil médicos, mais de 5,3 mil (29%) são médicos com registro no Brasil. Contudo, aproximadamente 2/3 dos municípios do PMM seguem ainda não atraindo os médicos brasileiros e isso faz com que, das 63 milhões de pessoas atendidas pelo Programa, 45 milhões só tenham atendimento devido à atuação dos médicos estrangeiros e brasileiros formados no exterior.
4- O médico brasileiro fica menos tempo e abandona mais a atividade

Outro dado importante é que o tempo de atuação no Programa para todos os médicos é de 3 anos, com exceção dos brasileiros que podem escolher ficar 3 anos ou apenas 1 ano. Mesmo assim, 40% dos brasileiros abandonam a atividade no Posto de Saúde antes de cumprir o prazo acordado. Este número no caso dos estrangeiros é de 15%, e especificamente no caso dos médicos cubanos é de apenas 8%.
5- Os médicos estrangeiros são muito bem avaliados e estão nos locais com maior necessidade

Os médicos estrangeiros, como já foi dito, estão nos locais com maior necessidade. Mas, além disso, as pesquisas de avaliação do PMM conduzidas pelas Universidades têm mostrado uma excelente aprovação desses médicos por parte da população e dos gestores municipais. Maior capacidade de atendimento e de resolver problemas sem precisar encaminhar, maior proximidade com a população e atendimento mais humanizado tem sido a marca mais forte da atuação desses médicos. Isso não se explica pelo fato de serem cidadãos cubanos, italianos, uruguaios ou das mais de 40 nacionalidades presentes no Programa. A grande questão é que são médicos que gostam de atuar na atenção básica e a maioria são especialistas em medicina de família e comunidade. Enquanto em diversos países há prioridade para essa especialização, no Brasil o modelo voltado para o especialista do setor privado e do hospital afasta e não prepara os médicos nem para a atenção básica nem para o SUS.
6- Das 2.700 vagas em Medicina de Família e Comunidade, apenas 760 foram ocupadas por médicos brasileiros, as demais ficaram ociosas.


O PMM também oferece vagas para que os médicos se formem como especialistas para a atuação na Atenção Básica. Mas do total de vagas oferecidas, que só podem ser ocupadas por médicos brasileiros, só 28% foram preenchidas. Hoje a residência, fundamental para mudar o perfil do médico no Brasil e para melhorar em muito a qualidade do atendimento no SUS, embora tenham melhorado a ocupação, ainda atrai pouco os médicos.
Com tudo isso fica claro que retirar os médicos formados no exterior do PMM prejudica mais de 45 milhões de brasileiros, justamente aquelas que mais precisam e que moram nos municípios que têm menos condições de substituir esse médico por outro.
De fato, expulsar os médicos estrangeiros é um desejo das entidades médicas mais conservadoras. Mas é pouquíssimo democrático deixar que a xenofobia e preconceito de alguns milhares prejudique a vida de dezenas de milhões. Além disso, é pouco inteligente fazer o contrário que diversos países do mundo têm feito: aumentar o estímulo para contar com médicos estrangeiros em seus sistemas de saúde. Nos EUA mais de 1/4 dos médicos são formados no exterior e no Reino Unido quase 40%.
Também não é inteligente querer agradar a um grupo pequeno e extremista e desagradar não só 45 milhões de pessoas atendidas e mais de 3 mil prefeitas e prefeitos beneficiados. Fazer isso depois da eleição, pode parecer esperto, mas não é e, além disso, é desleal, oportunista e demagógico.

Contudo, oferecer mais estímulo aos médicos brasileiros, sem prejuízo dos estrangeiros, garantindo a sustentabilidade do Programa no médio prazo é uma medida não só inteligente como necessária. Uma boa ideia seria garantir à Bolsa de Residência em Medicina de Família e Comunidade o mesmo valor da Bolsa do Mais Médicos quando aquela acontecesse nos serviços de atenção básica em localidades que o SUS tem necessidade: seria garantido apenas aos brasileiros tudo o que eles já tem no PMM e agregar ainda mais um título de especialista que é importante não só para a qualidade do atendimento no SUS, mas até para que esse médico possa formar outros médicos nas novas escolas de medicina abertas também pelo PMM.

segunda-feira, 28 de março de 2016

Como ficariam a Saúde e o SUS num “pós impeachment”?


Artigo de Hêider Pinto -  Médico e Mestre em Saúde Pública
Publicado no site BRASIL 247  - www.brasil247.com.br 


Nosso artigo pretende analisar quais as intenções e propostas que o grupo que quer chegar ao poder, sem passar por uma eleição, tem para a saúde e o SUS. Para isso nos baseamos nos documentos emitidos pelo Instituto Ulisses Guimarães do PMDB, dentre eles o "Ponte para o Futuro", e, complementarmente, entrevistas dadas por Moreira Franco e discursos e projetos de lei de lideranças desse grupo.
Essa é entendida como a prioridade zero, mas seu enfrentamento no campo da política econômica é todo de médio ou longo prazo. Então como o documento Ponte para o Futuro pretende enfrentar o déficit público: venda de ativos (privatizações), Estado deixar de atuar como agente econômico (no petróleo, por exemplo) e redução do gasto público. Neste texto trataremos do último ponto, os outros dois em outro que ainda faremos como parte da série de artigos que estamos editando sobre os "bastidores do golpe".
O documento "Ponte para o Futuro" traz explicitamente algumas medidas com grande impacto na saúde: "acabar com as vinculações constitucionais estabelecidas, como no caso dos gastos com saúde e com educação"; "estabelecer um limite para as despesas de custeio inferior ao crescimento do PIB, através de lei".
Lembremos o movimento de saúde produziu uma grande conquista ao povo brasileiro quando, depois de muita luta, conseguiu aprovar a Emenda Constitucional 29 em 2000 que garantiu que a cada ano os recursos da Saúde aumentassem conforme a variação do PIB e a inflação. Mesmo assim, 16 anos depois o Brasil tem um gasto público de 4,7% do PIB enquanto Uruguai tem 6,1% e países com sistemas universais, como o nosso, apresentam: Canadá e Reino Unido, ambos 7.6% e França 9%.
Em 2013, antes da desvalorização do real, o gasto público do Brasil per capita era de 525 dólares, o do Uruguai $ 992, do Canadá $3.985 e França $3.741.
Há menos de 10 dias, dada a situação de flagrante subfinanciamento do SUS, a Câmara aprovou a EC 01 de 2015 que garante até 2023 a aplicação de 19,4% da receita corrente líquida, o que ampliaria os recursos federais para a saúde em aproximadamente 33%.
Portanto, vale dizer que essa vitória será em vão e não se concretizará, porque com a desvinculação do orçamento permanente (não temporária) e com o impedimento de aumentar acima da variação do PIB, vale dizer que o SUS, que já está subfinanciado, não sairá desta condição.
O Governo Collor vetou os artigos da Lei Orgânica da Saúde que tratavam do financiamento impedindo o SUS de nascer adequadamente. Os anos de FHC tampouco mudaram isso e o SUS seguiu subfinanciado. Caso o Golpe se concretizasse teríamos uma terceira fase de muita luta para o povo brasileiro em geral e para o movimento sanitário em especial: a "tempestade perfeita" para mudar o SUS que temos hoje.
SUS ainda mais subfinanciado; redução de recursos para os serviços existentes e redução de serviços; demanda maior que oferta e aumento do tempo de espera e filas e déficit de atendimento; insatisfação crescente com o sistema público.
Um ambiente no qual a população teme a crise e com alto grau de insatisfação com o SUS é o momento "ideal" de aprovar medidas previstas na Ponte para o Futuro como a "transferências de ativos que se fizerem necessárias, (...) parcerias para complementar a oferta de serviços públicos". Moreira Franco em entrevista ressuscitou as políticas focalistas dos anos 90 argumentando que o Estado deveria se concentrar nos 20% mais pobres. Neste caso a ponte seria para o passado.
MAS ASSIM, O QUE ACONTECERIA COM 60% DA POPULAÇÃO

Mas se apenas 20% têm plano de saúde (e mesmo assim a maioria destes usa serviços do SUS) e o Estado focalizaria em outros 20%, o que restaria para 60% da população?

Temos duas pistas. Uma na Agenda Brasil proposta pelo PMDB do Senado na qual uma das propostas é "cobrança diferenciada de procedimentos do SUS por faixa de renda. Considerar as faixas de renda do IRPF". Medida que na crise de 2011 Portugal tomou e que teve resultados muito ruins em termos de saúde como pode ser contatado em vários estudos de saúde.
Outra pista está no Projeto de Emenda Constitucional 451/2014 de autoria de Eduardo Cunha (dirigente do impeachment e segundo na linha sucessória caso concretizado) que obriga as empresas a pagarem planos de saúde privados para todos os seus empregados por meio da inserção dessa línea na Constituição: "plano de assistência à saúde, oferecido pelo empregador em decorrência de vínculo empregatício, na utilização dos serviços de assistência médica".
Além da consequência óbvia do fim de uma saúde com equipes multiprofissionais e base e vínculo territorial integrando promoção, prevenção, recuperação e reabilitação, teríamos Plano de Saúde que hoje raros oferecem serviços de qualidade para 20% ampliados para mais de 50% da população que tem empregos formais e suas famílias.
Restaria ainda saber o que fazer com aqueles que não estão entre os 20% mais pobres e que não têm emprego formal, como muitos autônomos e empreendedores individuais...

Mas quem se importa? A Proposta desse grupo, em primeiro lugar é enfrentar a Crise, em segundo é reduzir os gastos do Estado, em terceiro é focalizar a ação do Estado. Nem em quarto nem em quinto é garantir os Direitos Constitucionais ou ampliá-los. É por isso que tenho repetido: o maior papel do impeachment, que do modo como está sendo levado a cabo, é um Golpe, é implantar outro projeto político no Brasil, sem passar pelo debate e crivo eleitoral, que enfrenta a crise colocando na conta da população que mais precisa do Estado que, no caso da saúde, corresponde a 80%. Enfrentar a crise, às custas da saúde da população.

Fonte: http://www.brasil247.com/pt/247/artigos/222887/Como-ficariam-a-Sa%C3%BAde-e-o-SUS-num-%E2%80%9Cp%C3%B3s-impeachment%E2%80%9D.htm