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domingo, 29 de abril de 2012

"A importância da espiritualidade para a saúde "

Texto escrito por Leonardo Boff, em sua coluna no Jornal do Brasil deste domingo (29/04), disponível em http://www.jb.com.br/leonardo-boff/noticias/2012/04/29/a-importancia-da-espiritualidade-para-a-saude/


"Via de regra todos os operadores de saúde, médicos, médicas e enfermeiros e enfermeiras, foram moldados pelo paradigma científico da modernidade que operou um uma separação clara entre corpo e mente, entre ser humano e natureza. Criou as muitas especialidades que tantos benefícios trouxeram para o diagnóstico das enfermidades e também para as formas de cura.

Reconhecido este mérito, não se pode esquecer que se perdeu a visão de totalidade: o ser humano inserido num todo maior e a doença como uma fratura nesta totalidade e a cura como sua reconstrução.

Há uma instância em nós, que responde pelo cultivo desta totalidade, que nos alimenta o sentimento de pertença e que zela pelo eixo estruturador de nossa vida: é a dimensão do espírito. De espírito vem espiritualidade. Espiritualidade é o cultivo daquilo que é próprio do espírito que é sua capacidade de projetar visões unificadoras, de relacionar tudo com tudo, de ligar e re-ligar todas as coisas entre si e com a Fonte Originária de todo ser.

Se espírito é relação e vida, seu oposto não é matéria e corpo mas a morte como ausência de relação. Nesta acepção, espiritualidade é toda atitude e atividade que favorece a expansão da vida, a relação consciente, a comunhão aberta, a subjetividade profunda e a transcendência como modo de ser, sempre disposto a novas experiências e a novos conhecimentos.
Neurobiólogos e estudiosos do cérebro identificaram a base biológica da espiritualidade. Ela se situa no lobo frontal do cérebro. Verificaram empiricamente que sempre que se captam os contextos mais globais ou ocorre uma experiência significativa de totalidade ou também quando que se abordam de forma existencial (não como objeto de estudo) realidades últimas, carregadas de sentido e que produzem experiências de veneração, devoção e respeito, se verifica uma alta de vibração em hertz dos neurônios. Chamaram a este fenômeno de “ponto Deus” no cérebro ou da emergência da “mente mística”. Trata-se de uma espécie de órgão interior pelo qual se capta a presença do Inefável dentro da realidade.
Este dado constitui uma vantagem evolutiva do ser humano que, enquanto homem-espírito, percebe a Última Realidade penetrando em todas as coisas. Dá-se conta de que pode, surpreendetemente, entabular um diálogo e buscar uma comunhão íntima com ela. Tal possibilidade o dignifica, pois o liberta do desenraizamento, o espiritualiza e o leva a graus mais alto de percepção do Elo que liga e re-liga todas as coisas.
Este “ponto Deus” se revela por valores intangíveis como mais amorização, mais compaixão, mais solidariedade, mais sentido de respeito e de dignidade. Despertar este “ponto Deus”, tirar as cinzas que uma cultura demasiadamente racionalista e materialista o cobriu, é permitir que a espiritualidade aflore na vida das pessoas.
No termo, espiritualidade não é pensar Deus mas sentir Deus mediante este órgão interior e fazer a experiência de sua presença e atuação a partir do coração. Ele é percebido como entusiasmo (em grego significa ter um deus dentro) que nos toma e nos faz saudáveis e nos dá a vontade de viver e de criar continuamente sentido de existir e de trabalhar.
Que importância emprestamos a esta dimensão espiritual no cuidado da saúde e da doença? Ela possui uma força curativa própria. Não se trata de forma nenhuma de algo mágico e esotérico. Trata-se de potenciar aquelas energias que são próprias da dimensão espiritual tão válida como a inteligência, a libido, o poder, o afeto entre outras dimensões do humano. Estas energias são altamente positivas como amar a vida, abrir-se ao demais, estabelecer laços de fraternidade e de solidariedade, ser capaz de perdão e de misericórida e de indignação face às injustiças deste mundo.

Além de reconhecer todo o valor das terapias conhecidas, da eficácia dos diferentes fármacos, existe ainda um supplément d’ame como diriam os franceses. Ela quer sinalizar um complemento daquilo que já existe mas que o reforça e enriquece com fatores oriundos de outra fonte de cura. O modelo estabelecido de medicina não detém, por certo, o monopólio da cura e da compreensão da complexa condição humana, ora sã e ora enferma. É aqui que encontra o seu lugar, dentro do campo da medicina científica, a espiritualidade.
A espiritualidade reforça na pessoa, em primeiro lugar, a confiança nas energias regenerativas da vida, na competência do corpo médico e no cuidado diligente da enfermeira ou do enfermeiro. Sabemos pela psicologia do profundo e da transpessoal, o valor terapêutico da confiança na condução normal da vida. Confiar na vida significa fundamentalmente afirmar: a vida tem sentido, ela vale a pena, ela detém uma energia interna que a autoalimenta, ela é preciosa. Essa confiança pertence a uma visão espiritual do mundo.
Pertence à espiritualidade, a convicção de que a realidade é maior do que aquela que captamos com nossos sentidos e com os instrumentos de análise. Podemos ter acesso a ela pelos sentidos interiores, pela intuição e pela razão cordial. Todos os cientistas sabem que a realidade não cabe totalmente em nossos conceitos. Percebe-se que há uma ordem maior, subjacente à ordem sensível, como o sustentava sempre o grande físico, prêmio Nobel, David Bohm, aluno predileto de Einstein.
Esta ordem subjacente responde pelas ordens visíveis e ela sempre pode nos trazer surpresas. Não raro, os próprios médicos se surpreendem, com a rapidez com que alguém se recupera ou mesmo com situações, normalmente, dadas como irreversíveis, regridem e acabarem levando à cura. No fundo é crer que o invisível e o imponderável são parte do visível e do previsível. A visão quântica da realidade confirma o acerto desta perspectiva.
Pertence também ao mundo espiritual, a esperança imorredoura de que a vida continua para além da morte, de que nossos desejos de cura, nossos sonhos de voltar à vida normal deslancham energias positivas que contribuem na regeneração.
Força maior, entretanto, é a fé de sentir-se sob o olhar bondoso de Deus, Pai e Mãe de bondade e de estar, como filhos e filhas, na palma de sua mão. Entregar-se, confiadamente, à sua vontade, desejar ardentemente a cura e a vida mas também acolher serenamente sua vontade de chamar-nos para si. Na perspecitva espiritual, a morte não é entendida como um desfecho trágico mas como uma travessia na direção da Fonte da vida.
Não morremos, mas nos transfiguramos. Deus nos vem buscar e nos levar para onde desde sempre pertencemos, para a sua Casa e para o seu convívio. Aqui se aviva o “ponto Deus no cérebro” que se revela através de tais convicções espirituais altamente terapéuticas. Trazem serenidade face a um desenlace inevitável. A morte aparece então como uma sábia invenção da vida para esta que possa continuar num outro nivel mais alto."

Leonardo Boff
Teólogo, filósofo e autor de O Cuidado Necessário, prestes a sair pela Vozes

Imagem extraída de: http://econexos.com.br/sempre-um-papo-leonardo-boff 

quarta-feira, 11 de maio de 2011

Leonardo Boff...e Osama Bin Laden!

Esse texto foi extraído de: http://leonardoboff.wordpress.com/2011/05/05/fez-se-vinganca-nao-justica/
Mais um convite a pensar...

Fêz-se vingança, não justiça


05/05/2011

por Leonardo Boff

.Alguém precisa ser inimigo de si mesmo e contrário aos valores humanitários mínimos se aprovasse o nefasto crime do terrorismo da Al Qaeda do 11 de setembro de 2001 em Nova Iorque. Mas é por todos os títulos inaceitável que um Estado, militarmente o mais poderoso do mundo, para responder ao terrorismo se tenha transformado ele mesmo num Estado terrorista. Foi o que fez Bush, limitando a democracia e suspendendo a vigência incondicional de alguns direitos, que eram apanágio do pais. Fez mais, conduziu duas guerras, contra o Afeganistão e contra o Iraque, onde devastou uma das culturas mais antigas da humanidade nas qual foram mortos mais de cem mil pessoas e mais de um milhão de deslocados.

Cabe renovar a pergunta que quase a ninguém interessa colocar: por que se produziram tais atos terroristas? O bispo Robert Bowman de Melbourne Beach da Flórida que fora anteriormente piloto de caças militares durante a guerra do Vietnã respondeu, claramente, no National Catholic Reporter, numa carta aberta ao Presidente:”Somos alvo de terroristas porque, em boa parte no mundo, nosso Governo defende a ditadura, a escravidão e a exploração humana. Somos alvos de terroristas porque nos odeiam. E nos odeiam porque nosso Governo faz coisas odiosas”.

Não disse outra coisa Richard Clarke, responsável contra o terrorismo da Casa Branca numa entrevista a Jorge Pontual emitida pela Globonews de 28/02/2010 e repetida no dia 03/05/2011. Havia advertido à CIA e ao Presidente Bush que um ataque da Al Qaeda era iminente em Nova York. Não lhe deram ouvidos. Logo em seguida ocorreu, o que o encheu de raiva. Essa raiva aumentou contra o Governo quando viu que com mentiras e falsidades Bush, por pura vontade imperial de manter a hegemonia mundial, decretou uma guerra contra o Iraque que não tinha conexão nenhuma com o 11 de setembro. A raiva chegou a um ponto que por saúde e decência se demitiu do cargo.

Mais contundente foi Chalmers Johnson, um dos principais analistas da CIA também numa entrevista ao mesmo jornalista no dia 2 de maio do corrente ano na Globonews. Conheceu por dentro os malefícios que as mais de 800 bases militares norte-americanas produzem, espalhadas pelo mundo todo, pois evocam raiva e revolta nas populações, caldo para o terrorismo. Cita o livro de Eduardo Galeano “As veias abertas da A.Latina” para ilustrar as barbaridades que os órgãos de Inteligência norte-americanos por aqui fizeram. Denuncia o caráter imperial dos Governos, fundado no uso da inteligiência que recomenda golpes de Estado, organiza assassinato de líderes e ensina a torturar. Em protesto, se demitiu e foi ser professor de história na Universidade da Califórnia. Escreveu três tomos “Blowback”(retaliação) onde previa, por poucos meses de antecedência, as retaliações contra a prepotência norte-americana no mundo. Foi tido como o profeta de 11 de setembro. Este é o pano de fundo para entendermos a atual situação que culminou com a execução criminosa de Osama Bin Laden.

Os órgãos de inteligência norte-americanos são uns fracassados. Por dez anos vasculharam o mundo para caçar Bin Laden. Nada conseguiram. Só usando um método imoral, a tortura de um mensageiro de Bin Laden, conseguiram chegar ao su esconderijo. Portanto, não tiveram mérito próprio nenhum.

Tudo nessa caçada está sob o signo da imoralidade, da vergonha e do crime. Primeiramente, o Presidente Barak Obama, como se fosse um “deus” determinou a execução/matança de Bin Laden. Isso vai contra o princípio ético universal de “não matar” e dos acordos internacionais que prescrevem a prisão, o julgamento e a punição do acusado. Assim se fez com Hussein do Iraque,com os criminosos nazistas em Nürenberg, com Eichmann em Israel e com outros acusados. Com Bin Laden se preferiu a execução intencionada, crime pelo qual Barak Obama deverá um dia responder. Depois se invadiu território do Paquistão, sem qualquer aviso prévio da operação. Em seguida, se sequestrou o cadáver e o lançaram ao mar, crime contra a piedade familiar, direito que cada família tem de enterrar seus mortos, criminosos ou não, pois por piores que sejam, nunca deixam de ser humanos.

Não se fez justiça. Praticou-se a vingança, sempre condenável.”Minha é a vingança” diz o Deus das escrituras das três religiões abraâmicas. Agora estaremos sob o poder de um Imperador sobre quem pesa a acusação de assassinato. E a necrofilia das multidões nos diminui e nos envergonha a todos.



Leonardo Boff é autor de Fundamentalismo,terrorismo , religião e paz, Vozes 2009.